A perseguição aberta que as grandes empresas de mídia e de internet movem às publicações cristãs e conservadoras é a prova integral e definitiva de que a esquerda já perdeu toda legitimidade como porta-voz dos pobres e oprimidos e se tornou o instrumento de controle psicossocial com que a elite escraviza a mentalidade das massas.
Premeditado ou impremeditado, esse foi, em essência, o resultado da reforma do marxismo pela “Escola de Frankfurt”.
O retorno tardio de Georg Lukacs à linha-dura stalinista foi inútil. A “dialética negativa” já havia corroído, por igual, a “sociedade de confiança” e a “solidariedade proletária”. Em vez de construir o socialismo, havia apenas transformado o capitalismo num inferno.
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Esvaziado dos símbolos que dão um sentido moral ao trabalho, ao comércio, à poupança, à ordem social, ao direito e até às relações pessoais, a que se reduz o capitalismo senão àquela “capitalismo cru” terminal que segundo Marx deveria anunciar e anteceder imediatamente o advento do socialismo? Mas, sendo a economia socialista impossível na sua forma integral e viável somente na forma híbrida da economia fascista (com esse ou outro nome), que é que impede que o capitalismo cru se eternize, e que o faça precisamente por meio da substituição dos velhos símbolos culturais pela nova indústria dos simulacros? Quem não percebe que esse é precisamente o mundo em que vivemos hoje, tanto em Pequim quanto em Nova York?
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A tradução da linguagem dos sonhos na lógica dos desejos — a “interpretação dos sonhos”, segundo Freud — reduz os símbolos oníricos a disfarces provisórios e escamoteia assim aquilo que os desejos mesmos têm de semiótico e simbólico. De fato, é impossível desejar qualquer coisa sem ter falta dela, isto é, sem possuir dela nada mais que um signo sem a coisa dentro. Se o desejo fosse uma presença bruta e não apenas o aceno semiótico de uma ausência, a masturbação seria impossível e o desejo mesmo só poderia vir à tona na presença plena do seu objeto, o que o tornaria ao menos praticamente indistinguível da sua satisfação.
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A premissa fundante de todo marxismo — isto é, do marxismo tomado em toda a variedade dos seus estilos e versões — é que todos os problemas essenciais já estão resolvidos, e que, no fundo, só o que resta são questões de estratégia e de tática, se não de retórica e propaganda.
Essa premissa é estupidificante em si, mas o fato de que permaneça quase sempre inconsciente ou pelo menos indeclarada aumenta “ad infinitum” o seu poder de estupidificar.
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Ou os frankfurtianos padeciam daquela imprevidência radical que Eric Voegelin chamava de “estupidez criminosa”, ou eram pérfidos reacionários empenhados em transformar a esquerda em instrumento da dominação capitalista, ou eram apenas uns filhinhos-de-papai que se divertiam brincando de dialética negativa enquanto, do teto de um hotel de cinco estrelas, observavam o mundo pegar fogo. A primeira hipótese é a mais humana.
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Concessões esporádicas às exigências do “politicamente correto” — como outrora às da “linha justa” do Partido, a qual é exatamente a mesma coisa — não bastam para estragar por completo um romance, um filme, uma peça de teatro; mas quando essas exigências se tornam obrigatórias e onipresentes, elas acabam por violar as leis mais elementares da verossimilhança e assim destroem a possibilidade mesma da arte narrativa.
Eis por que o cinema de hoje busca sobretudo uma platéia de adolescentes, na qual a exigência da verossimilhança cede facilmente ante a ânsia de sensações fortes.
O julgamento de verossimilhança depende essencialmente da maturidade, da “experiência da vida”.
Olavode Carvalho
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