A Associação MP Pró-Sociedade e Docentes pela Liberdade vêm a público, esclarecer o seguinte, a respeito da operação de cumprimento de ordem judicial da justiça criminal no Rio de Janeiro, que resultou na morte de 27 pessoas, dentre elas, um policial civil.
O narcotráfico, que se encastelou nas favelas cariocas, assim como as milícias, desenvolvem suas ações criminosas de forma semelhante a grupos guerrilheiros insurgentes. Dominam grandes extensões de áreas urbanas, em grupos organizados, na posse de armas de infantaria militar, com táticas militares de enfrentamento, sem que, no entanto, até o presente momento haja o reconhecimento da necessidade de se aplicar as normas do direito de guerra nas operações policiais na repressão penal a esses grupos. De plano, observa-se uma nítida assimetria, pois o policial que for executar um mandado judicial expedido pela Justiça Criminal ou realizar uma prisão em flagrante deverá agir dentro dos limites do uso progressivo da força em operações policiais, porém em um cenário de guerra, em que, reconhecida a situação como conflito armado não internacional, as forças do Estado estariam amparadas pelo uso da força regulado pelas normas que regem o direito de guerra. Trata-se, por outro lado, de conflito duradouro, crônico, que se iniciou ainda na década de 70 do século passado. Suficiente organização dos atores não estatais para desenvolver ações bélicas, domínio territorial e conflito prolongado, são os requisitos aceitos para se considerar que a situação conflitiva ultrapassou os limites de violência que normalmente se observa em uma operação para aplicação da lei penal. O número de mortos nesse episódio é proporcional aos conflitos armados, mas não a uma operação policial. Tratando-se de crime organizado territorialmente, que impõe regras próprias às áreas dominadas e defende o encravamento com combate armado à maneira de grupos guerrilheiros, seria isso exatamente uma simples operação policial? E se a ADPF 635 interfere no conflito, limitando a entrada das forças de segurança, não estaria reforçando o encravamento, ou seja, o domínio territorial, um dos requisitos para que se considere a situação como conflito armado não internacional? Considere-se que é absolutamente impossível a polícia ingressar nesses locais sem que se inicie imediatamente um tiroteio contra os policiais, pois se trata de expulsar o invasor de uma área dominada. Fosse uma situação regida pelas normas do direito de guerra, o mandado judicial em questão seria dirigido à captura de criminosos de guerra, pois estariam a cometer crime de guerra, porquanto assim se considera o recrutamento de menores de 15 anos, à luz do Estatuto de Roma (Decreto n. 4388, de 25 de setembro de 20020, artigo 8º, e, vii). Aliás, também é crime de guerra no Estatuto de Roma, o homicídio, artigo 8º, c, i, muitos em execuções do tribunal do crime; utilizar as instalações civis e a presença de civis para facilitar as ações violentas, artigo 8º, b, xxiii; atacar locais de cultos, 8º, e, iv; estupros, artigo 8º, e, vi, dentre outros, cometidos, inclusive, contra quem ousou ingressar nos locais dominados sem autorização dos criminosos organizados. Também é certo que o que poderia ser visto como lei de abuso de autoridade, da mesma forma, poderia ser visto como crime de guerra, se praticado pelas forças de segurança. Importante lembrar, igualmente que o direito de guerra, ao contrário das normas internas e internacionais, que regem a atividade policial, estabelece limites ao uso da força detalhadamente. Algumas violações a essas normas caracterizam crimes de guerra. Não é curioso exigir do policial, nessas operações, regramentos próprios do direito de guerra, porém considerar que se trata apenas mais uma operação policial? Em segundo lugar, do ponto de vista da aplicação da lei penal, mesmo que se considerasse a situação como conflito armado não internacional, tratou-se de uma operação policial. É dever de todo magistrado e membro do Ministério Público presumir a legitimidade da ação dos agentes da lei. Deve-se presumir o óbvio, que os disparos dos criminosos constituem crime. Aliás, a posse e porte de armas de guerra constitui crime considerado hediondo. Ademais, a operação em questão foi autorizada por um magistrado, dentro de um processo criminal que tramita perante a Justiça do Estado do Rio de Janeiro, desencadeada para prender criminosos que aliciavam menores de 18 anos de idade para a prática de crimes e para recrutamento em ações armadas, justamente para que esses menores não se tornassem também criminosos e morressem em confrontos com policiais, pois, a legítima defesa não desaparece com a agressão contrária à ordem jurídica e armada partida de um menor de 18 anos. Presumida a legitimidade da ação policial, porque na sua origem está amparada pela ordem jurídica, caso no desenrolar da ação dos policiais tenha havido excesso – o que até agora não se evidenciou, existindo apenas ilações por parte dos que sempre se postam contra a policia – isso será apurado e punido, se for verdade, mas não se pode, de forma alguma, criminalizar antes da apuração, quem está no exercício da função policial, justamente combatendo o crime. Uma ação policial, legítima na sua origem, como tal deve ser analisada. A presunção de legitimidade acompanha todo ato administrativo. Por último, o que a sociedade exatamente quer? Quer viver sob a lei do crime ou sob a ordem legal ou jurídica brasileira? Associação MP Pró-Sociedade Docentes Pela Liberdade
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